domingo, março 27, 2011

O Preconceito

O preconceito é a desculpa que o ser humano dá para a existência da diferença, pois sua vontade suprema é ser rei (ou participar do reinado).
O pré-julgamento é a arte e ofício de quem deseja ser superior: atirar antes de perguntar. Rotular alguém por uma simples característica - aos olhos sociais, de doce veneno, passível de pré-julgamento massificado -, anulando tudo mais que o antes ser plural (agora uno) pode possuir. Mesmo um erro corrigido do passado faz o julgamento do presente ter base no mesmo passado. A experiência passada não prova o futuro. Quem julga sem conhecer a verdade - esta do presente -, quem julga pelo que os outros contam de outrem esquece e desfigura toda a possibilidade de mudança. Eu errei, você errou, mas, como sabemos muito bem, eu sou alguém, assim como você é, que possui a dignidade e a coragem de tornar algo correto, de mudar, nem que seja apenas no íntimo: não errar o mesmo novamente; tomar consciência de que um erro só é cometido para se aprender dele, e não voltar a cometê-lo (ou pelo menos tentar).
Agora, jogue a maçã para Eva, o errante para uma sociedade específica (escolha uma). O que vê? Dedos. Dedos apontando. Dedos tão, ou mais, sujos do que aquele que está no centro da atenção. Todos os dedos acusadores desejam estar limpos, entrar no recanto da supremacia, tornarem-se reis. Mas que dedos limpos são esses que todos os dias precisam de água e sabão para removerem sua sordidez? Não são mais do que peças encardidas que, cegos pela ignorância, desculpam-se de seus próprios erros ao jogar um pecado - a culpa - em qualquer um que possa ser colocado no centro das atenções. Desviam os olhos - e línguas - venenosos da sociedade de sua própria sujeira para a sujeira do próximo. O pior é que ninguém nota que a sujeira se torna ainda maior quando alguém aponta seu dedo sujo para a suposta indecência do outro, pois o preconceito é a cagada mais infecta que alguém faz: espalha como vírus pelo ouvido alheio. E, como vírus, sofre mutação por erros de replicação da informação, o que faz de uma possível verdade um monte de mentiras.
O próprio buraco da coluna da verdade é o preconceito. Atira, ultrapassa, modifica e repassa. É um ciclo vicioso que só para quando há desculpa: a chave da verdade. Então desculpe, conheça, entenda. Um pouco de tempo olhando, escutando ou vendo o buraco da coluna da verdade ser fechado é o bastante para entender que há mais do que parece haver; há mais do que se ouve dizer; há mais do que uma pele negra, um excesso de gordura, uma deficiência física. Há mais por trás da barreira (in)transponível do preconceito. Há um universo (de diferenças).